10/24/2021

A PALAVRA ENGRAVIDADORA DE SONHOS

A palavra falada morre assim que sai da boca. É um vento que esmaece rapidamente. Ocorre que, no ouvido que a ouve, coisas mil podem acontecer. O vento/fala tem o poder de penetrar o ouvido de alguém e ao fazê-lo entra e mexe com os circuitos neurais da pessoa, produz interpretações, conexões, emoções, sentimentos positivos ou negativos, gera ações.

Enquanto escrevo isto lembro-me do Salmo 126:6 “Aqueles que saíram chorando, levando a semente para semear, voltarão cantando, cheios de alegria, trazendo nos braços os feixes da colheita”. A palavra falada é semente lançada e os frutos nem sempre os conheceremos. Às vezes, alguns anos mais tarde, alguém virá nos agradecer por algo que dissemos e a ajudou ou mudou em um momento da vida.

Acho que se aplica aqui também a parábola do semeador (Mt 13: 3-9) “Ele disse: —Escutem! Certo homem saiu para semear. Quando estava espalhando as sementes, algumas caíram na beira do caminho, e os passarinhos comeram tudo. Outra parte das sementes caiu num lugar onde havia muitas pedras e pouca terra. As sementes brotaram logo porque a terra não era funda. Mas, quando o sol apareceu, queimou as plantas, e elas secaram porque não tinham raízes. Outras sementes caíram no meio de espinhos, que cresceram e sufocaram as plantas. Mas as sementes que caíram em terra boa produziram na base de cem, de sessenta e de trinta grãos por um. E Jesus terminou, dizendo: —Se vocês têm ouvidos para ouvir, então ouçam.”

A palavra falada não sabe qual terreno vai encontrar. Há os que parecem bons e que se mostram infrutíferos. Outros vicejam como arbusto que nasce na rachadura da pedra. Há os que têm passarinhos ávidos pelo que se lança e as sementes não logram germinar. Estes solos me fazem lembrar de uma senhora muito querida, de vida familiar complicada, que era membro da igreja que pastoreava. Todo domingo, terminado o sermão, ela me dizia: “o senhor pregou para mim hoje”, ou “este sermão foi maravilhoso”. Ocorre que, durante a semana, se eu a visitasse, ela não se lembrava do que havia ouvido no domingo. Solo falsamente frutífero.

Também encontro os que, nem bem a semente cai no solo, já a estão matando com críticas infundadas, porque nem se deram ao trabalho de examinar a semente. Os passarinhos que têm não a deixam frutificar.

A palavra tem a capacidade de gerar sonhos, de engravidar mentes, de fazer novos mundos. Ela deve ser verdadeira, dócil, mas assertiva. Ela deve semear esperança, mesmo que esta deva desconstruir sistemas caóticos. Ela tem a capacidade de iluminar a balbúrdia, o caos, o “tohu vabohu” e ordenar as coisas. Não é para menos que Jesus fez o alerta: “quem tem ouvidos para ouvir, ouça!”

Mistérios desta capacidade humana de falar e escutar, de expressar e ser entendido, mal-entendido, ser amado ou odiado. As palavras são mágicas: produzem ódios e amores.

Marcos Inhauser



Nenhum comentário:

Postar um comentário

ESTADO ESQUIZOFRÊNICO

Não é de hoje que falo, escrevo e protesto contra o Estado brasileiro nos seus diversos níveis. Há nele um aperfeiçoamento célere quando s...