10/07/2021

SONHAMOS E PENSAMOS PALAVRAS

Parece que na primeira infância, caracterizada pela inexistência de uma linguagem estruturada e lógica, não sabemos ao certo o que pensamos ou sonhamos. Tudo indica que, a partir de certo momento, à medida que vamos sendo treinados na fala, as coisas mudam. Os sonhos e pensamentos ganham palavras. Sonhamos alguém nos falando ou nós mesmos falando. Sonhamos algumas coisas mais inteligíveis, tais como animais ou insetos, brinquedos, situações que podemos descrever.

Os pensamentos vão ganhando complexidade à medida que o vocabulário aumenta. O que era mínimo vai ganhando musculatura, os pensamentos simples e banais vão ganhando complexidade e variações, porque se tem mais palavras para descrever e para agir no cérebro. O vocabulário agora inscrito no cérebro, pela ação das redes neurais e suas infinitas possibilidades, vai dando ao indivíduo a capacidade para melhor pensar.

Percebe-se, assim, que a capacidade de pensar, analisar e decidir está em estreita conexão com o vocabulário aprendido. Quanto menos se sabe, menos capacidade para entender as coisas da vida. Quanto mais se sabe e se estuda, mais ferramentas para situar-se no universo contextual no qual está inserido. O processo cognitivo é infinito e a pessoa deve desenvolvê-lo em todas as etapas da vida. Quem para de ler ou estudar, é como se assumisse uma marcha lenta na vida.

Quanto menos vocabulário a pessoa tem, mais cheia de certezas será, porque há pouco o que processar para analisar e decidir. Seus parcos neurônios farão as sinapses possíveis e a dúvida, característica de pessoas mais bem educadas, não estará em suas possibilidades. Nada mais ignorante que uma pessoa que pensa que sabe tudo. O maniqueísmo binário dos raciocínios medíocres classifica que se não é “A” tem que ser “B”. Ele é bi cromático: tudo é branco ou preto. Nunca viu, nem verá, as tonalidades de cinza que só o estudo, as leituras, as conversas enriquecedoras propiciam.

Nas redes sociais há exemplos desta proliferação de gente que tem opinião sobre tudo, que entende desde cesariana até motor à explosão, que consegue dividir um fio de cabelo ao meio. Vocabulário escasso, mente curta, raciocínio infantil, conclusões enviesadas, afirmativas bombásticas sobre a insignificância. Falam o óbvio clamando “eureka”.

Marcos Inhauser

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