11/11/2021

A PALAVRA QUE SE TORNA PALAVRA



A simples menção do seu nome produz urticária em muita gente: Karl Barth. Quem o estudou tem por ele respeito pela densidade do seu pensamento, pela criticidade ao liberalismo e pela sua compreensão da graça divina. Quem só ouviu falar dele, provavelmente só saiba o que ele afirmou: a Bíblia não é a palavra de Deus, mas se torna palavra de Deus.

Ele afirma que se deve distinguir a revelação do testemunho da revelação. Para ele, a Bíblia é a forma como a revelação chega a nós. Os escritores originais eram os depositários da revelação. A Bíblia é o testemunho da revelação e ambas estão unidas.

A Bíblia em si não é revelação ou Palavra de Deus em si mesma e não se pode ter a Palavra de Deus guardada na estante. A revelação não é possessão humana, mas de Deus. Não é a avaliação pessoal ou da comunidade que a torna Palavra de Deus, pois ela se torna Palavra de Deus por ação da liberdade da graça, que faz com que o testemunho se torne revelação para o leitor/ouvinte. O receptor original viu e ouviu e disto testemunhou.

A Palavra de Deus não é objeto, mas evento. Não é estática, mas dinâmica. Não é passado, mas atualizada cada vez que a lemos. Ela é viva e eficaz. Ela se torna Palavra quando temos com ela uma experiência em que se torna vivida por nós.

Barth vê a Bíblia como coleção de textos humanos. O divino nas Escrituras não anula as características humanas, inclusive a falibilidade de seus escritores. Diferentemente da abordagem conservadora, Barth entende que os escritores bíblicos não distinguiam história de lendas ou sagas como fazemos modernamente. Devemos nos colocar diante desses textos crendo na Palavra de Deus que dela pode emergir. Este ministério é a ação do Espírito Santo fazendo com que o texto tenha aplicabilidade e vivência na vida dos leitores/ouvintes.

Este posicionamento é, a meu ver, muito mais rico e dependente da graça de Deus. Cada vez que me acerco ao texto, oro e espero que ele seja experiencial na minha vida e quando isto acontece, a Palavra de Deus se somatiza na minha vida. Não fico discutindo o sentido exato, mas, como diria um dos pioneiros da anabatismo, Hans Denk, “Ninguém pode conhecer verdadeiramente a Cristo, se não seguí-Lo durante a vida”.

Marcos Inhauser

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