A teoria comunicacional, especialmente a sistêmica, tem o conceito de discursos que têm significado zero. Vou dar um exemplo: o professor coloca na lousa já cheia de coisas que ensinou, a seguinte nota: “tudo o que eu escrevi nesta lousa é mentira”. Quem vê isto fica pensando: se tudo o que está na lousa é mentira, então tudo o que ele ensinou é mentira, mas se tudo é mentira, até a mesma afirmação de que é mentira é uma mentira, logo tudo passa a ser verdade.”
Para que uma alocução tenha significado zero, as duas partes devem ter pesos iguais. Se a primeira parte é mais fraca que a segunda que nega a primeira, esta prevalecerá. Se a segunda parte é mais fraca que a primeira, prevalecerá.
Quando hoje vi a declaração do presidente à PF sobre a sua suposta ingerência no comando da Polícia Federal, conforme denúncia do ex-ministro da Justiça, de imediato conclui que se tratava de afirmação de significado zero: “não interferi, mas queria alguém com quem tivesse interlocução”.
Depois de um tempo, reavaliei a conclusão e percebi que há pesos desiguais nas afirmativas. As primeiras (“falta de interlocução que havia entre o presidente da República e o diretor da Polícia Federal; que não havia qualquer insatisfação ou falta de confiança com o trabalho realizado pelo DPF Valeixo, apenas uma falha de interlocução;”) perde em densidade para as demais feitas em seguida: “a.) Que sugeriu ao ex-ministro Sergio Moro a nomeação do DPF Ramagem para a Direção-Geral; b.) que indicou o DPF Ramagem em razão da sua competência e confiança construída ao longo do trabalho de segurança pessoal do declarante durante a campanha eleitoral de 2018; c.) que ao indicar o DPF Ramagem ao ex-ministro Sergio Moro, este teria concordado com o presidente desde que ocorresse após a indicação do ex-ministro da Justiça à vaga no Supremo Tribunal Federal; d.) que conheceu o DPF Ramagem após o 1° turno quando ele assumiu a coordenação da segurança do então candidato Jair Bolsonaro; e.) que salvo engano os filhos do declarante também conheceram Ramagem somente quando ele assumiu a segurança do declarante; f.) que nunca teve como intenção, com a alteração da Direção Geral, obter informações privilegiadas de investigações sigilosas ou de interferir no trabalho de Polícia Judiciária ou obtenção diretamente de relatórios produzidos pela Polícia Federal.
g.) que o declarante quis dizer que não obtinha informações de forma ágil e eficiente dos órgãos do Poder Executivo, assim como da própria Polícia Federal; h.) que quando disse "informações" se referia a relatórios de inteligência sobre fatos que necessitava para a tomada de decisões e nunca informações sigilosas sobre investigações”.
Perceba-se o desequilíbrio nas afirmações e no paradoxo da tese: “precisa de alguém com quem tivesse interlocução para saber o que estava acontecendo, mas que isto não era interferência.”
Ele queria na PF alguém para tomar Tubaína juntos e falar de futebol. Como uma conversa do presidente com um subordinado de segundo grau (ele é subordinado ao Ministro da Justiça) iria entender as recomendações do chefe supremo?
Perdão se vejo lagarto nesta maravilhosa samambaia. Mas a minha educação crítica me leva isto.
Marcos Inhauser
Assinar:
Postar comentários (Atom)
ESTADO ESQUIZOFRÊNICO
Não é de hoje que falo, escrevo e protesto contra o Estado brasileiro nos seus diversos níveis. Há nele um aperfeiçoamento célere quando s...
-
Não é de hoje que falo, escrevo e protesto contra o Estado brasileiro nos seus diversos níveis. Há nele um aperfeiçoamento célere quando s...
-
Estava tomando um café, em visita a meus pais. A certa altura perguntei: ― Pai, o senhor tem notícias do Fulano e da Beltrana? — Há t...
-
Dona Elpídia: eu a conheci na Igreja Presbiteriana de Jaú. Já idosa, com ela fui visitar vários membros da igreja. Ela tinha o dom do serv...
Nenhum comentário:
Postar um comentário